Liga Europa: Elas não matam, mas moem
O Banco Comercial Português (BCP) anda numa tal maré de azar, que duvido que qualquer um dos membros do Conselho de Administração jogue, sequer, um bingo em família a feijões. Desde a saída do histórico fundador Jardim Gonçalves que nos corredores da sede do maior banco privado português o mais ouvido lamento deva ser: «Ai a nossa vida a andar para trás». E não há dúvida nenhuma que uma vez engatada a marcha-atrás, para meter a primeira de novo tem sido um caso sério. É caso para dizer que o BCP tem dado dois passos atrás, para poder dar um para a frente, ainda que tímido. Como o país, no fundo.
Deixemos a costela James Bondiana de Carlos Santos Ferreira para o fim e comecemos por ordem cronológica, se é que não me irá falhar algum episódio pelo caminho.
A saída de Jardim Gonçalves e a sua substituição por Paulo Teixeira Pinto, dupla que se viria a incompatibilizar e que ditaria a saída do segundo, foi apenas o abrir da porta aos mexericos que passaram a alimentar gulosamente páginas de jornais e precioso tempo de antena, que o banco não viu propriamente como publicidade gratuita. Era o início de um conflito interno que viria a desgastar a imagem da maior instituição bancária nacional, ao ponto de virem à praça pública, no que me pareceu na altura como uma fuga revanchista de informação, as verbas pornograficamente astronómicas envolvidas nas indemnizações a pagar a cada um dos CEO's e CFO's e outros CO's que agora não me ocorrem, inclusive a Filipe Pinhal, que esteve escassos meses na presidência do banco, até enstourar na imprensa o escândalo do BCP ter usado umas sociedades off-shore para comprar acções do próprio BCP e assim influenciar artificialmente o seu preço no mercado. Picasso teria considerado, sem dúvida, que este fora o período negro do BCP.
Mas se a coisa começou a ficar preta, as várias tentativas de recuperar têm sido desastrosas. A entrada em cena de Carlos Santos Ferreira na presidência do BCP foi esmagadora: 98% dos votos dos accionistas, derrotando Miguel Cadilhe. Merece, desde logo, o meu reconhecimento já que trabalhou directamente para António Champalimaud (sete anos) na seguradora Mundial, mas ao trazer Armando Vara da Caixa Geral de Depósitos desgraçou-se. Não sou eu que o digo. Fernando Ulrich, do BPI, ainda hoje o culpa disso mesmo. Foi, na altura, uma decisão que causou alguns dissabores ao novo comandante do porta-aviões financeiro, mas que o próprio tratou de defender com unhas e dentes. Correu-lhe mal. Havia uma Face Oculta do antigo ministro da Juventude e do Desporto que Santos Ferreira desconhecia e que voltou a manchar a imagem do banco. Costuma dizer-se que enquanto vai e vem o pau, folgam as costas, mas duvido seriamente que estas viagens da madeira castigadora sejam suficientes para o departamente de comunicação do BCP folgar.
São umas atrás das outras. Como se não bastasse, apareceu na semana passada a WikiLeaks a dar conta de uma mensagem do Embaixador dos EUA em Lisboa, a dar conta que o presidente do BCP se disponibilizou para espiar o Irão, caso o banco abrisse negócio naquele país. Santos Ferreira terá amaldiçoado a hora de ter recomeçado a ler John Le Carré. É claro que em entrevista à TVI, classificou tudo como uma tonteria completa. Pelo que me dá a perceber, o presidente do BCP acabou por chamar tonto ao senhor embaixador, já que a WikiLeaks limitou-se a transcrever o que vinha no telegrama. Não coloco em causa a seriedade do presidente do BCP. Há até quem o conheça melhor do que eu e lhe reconheça uma autoridade moral que não renego, mas então não era tonto que deveria ter chamado ao embaixador norte-americano em Lisboa e sim mentiroso.
Como não podia deixar de ser, o próprio Santos Ferreira acabou por admitir que tais notícias eram prejudiciais para si e para o banco. What else?! Mais uma tentativa falhada de sair do período negro, que parece não ter fim. É que elas não matam, mas moem. De certeza.
P.S. Gostava, sinceramente, de ter ouvido o telefonema que Santos Ferreira fez ao Embaixador do Irão depois disto de tudo ter vindo a público. E, infelizmente, não vi nenhum órgão de informação a tentar obter um comentário do diplomata, o que foi pena. É nestas alturas que fica sempre bem uma oportuna sacudidela do capote tipo: «Tentámos obter uma reacção do senhor Rasool Mohajer, que não quis prestar declarações sobre o assunto».
Imagem: "Memories of a War" Alguns Direitos Reservados por S n o R k e l