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31 da Sarrafada

31 da Sarrafada

18
Nov10

Liga Europa: O Tollan é nosso e há-de ser

Pedro Figueiredo

 

 

Não preciso de dizer mais nada. Lembram-se todos, com certeza, do porta-contentores inglês que encalhou a 16 de Fevereiro de 1980 no Tejo, mesmo em frente ao ministério da Marinha (ele há com cada coincidência!) e que, dois dias depois, virou-se ainda mais, ficando de casco (vermelho) à mostra, tornando-se um perigo para a navegação. Mas, como sempre, os portugueses têm uma apetência especial para ver coisas boas na desgraça e até houve quem ficasse com o naufragado navio na memória como um dos monumentos nacionais de eleição. Aliás, descobri até que parte do material do famoso navio serve de decoração a um bar chamado "A Casa do Leme".

 

A coisa também não era para menos. Foram três anos (acabou por ser removido somente a 2 de Dezembro de 1983, após várias tentativas falhadas) que aquela peça metálica, mais parecida com um futurista parque de skate, esteve à vista de todos, chegando mesmo a alimentar as tardes de muitos reformados. Grande parte da terceira idade lisboeta perdeu largas horas sentada nos bancos de pedra do muro do Terreiro do Paço junto ao rio a mandar os seus palpites sobre a melhor forma de virar e remover facilmente o navio. Isto, claro está, durante as várias tentativas infrutíferas que iam sendo feitas. Imaginam-se os comentários: «Obviamente que assim não vão a lado nenhum...»

 

Por fim, lá veio uma equipa do estrangeiro para finalmente tirar dali o que já era visto como uma vergonha nacional. Havia mesmo quem dissesse que o barco, dali, já não saía.

 

Lembrei-me do Tollan, por associação de ideias à discussão do último Orçamento de Estado e da possível entrada do FMI. Mais outra parvoíce como outra qualquer. Está visto que, por mais voltas que a democracia portuguesa dê, a alternância de poder está no mesmo ponto em que se encontrava a monarquia no final dos seus tempos. O rotativismo de então, entre regeneradores e progressistas, só deu lugar ao actual rotativismo entre socialistas e social-democratas. Qual é a diferença? Não pagamos adiantamentos ao rei, mas pagamos (e bem) os adiantamentos (a fundo perdido) que outros fizeram para construirem resorts de luxo em Cabo Verde.

 

Enquanto isso, o país, encalhado, assiste a tentativas de virar a situação (e só lá vai mesmo com uma rotação de 180 graus), cheia de 'reformados' (não em bancos de pedra, mas nas cadeiras das televisões, em talk shows) a mandar os seus palpites em como seria simples e eficaz dar a volta à desgraça, quando a solução poderá ter mesmo de chamar novamente a rapaziada de fora (FMI) para dar conta do recado.

 

Ninguém se entende. Trocam-se acusações (olha que novidade!), trocam-se carros topo de gama como quem contrata assessores, trocam-se robalos por favores, trocam-se frutas por arbitragens, trocam-se nacionalidades e até o país pela Europa. Por prestígio, apenas. Trocas e baldrocas de quem faz orelhas moucas ao que se passa fora dos gabinetes de São Bento. Às vezes até fico na dúvida se sabem mesmo o que se passa ou se pensam que o povo é sereno e é só fumaça!

 

O Tollan continua encalhado, meus caros. E pelo andar da carruagem vai continuar assim por muito tempo.

 

Já agora, deixo um excerto d'Os Maias, que ando a reler, muito curioso...

 

O Cohen colocou uma pitada de sal à beira do prato, e respondeu, com autoridade, que o empréstimo tinha de se realizar «abruptamente». Os empréstimos em Portugalconstituíam hoje uma fonte de receita, tão regular, tão indispensável, tão sabida como o imposto. A única ocupação mesmo dos ministros era esta - «cobrar imposto» e «fazer o empréstimo». E assim havia de continuar...

Carlos não entendia nada de finanças: mas parecia-lhe que, desse modo, o país ia alegremente e lindamente para a bancarrota.

- Num golpezinho muito seguro, e muito directo - disse Cohen sorrindo - Ah, sobre isso, ninguém tem ilusões, meu caro senhor. Nem os próprios ministros da Fazenda!... A bancarrota é inevitável: é como quem faz uma soma...

 

Foto de ALFREDO CUNHA/LUSA PRT Lisboa LUSA © 2008 LUSA - Agência de Notícias de Portugal, S.A

28
Out10

O OE e o FMI trocado em moedas de cinco cêntimos

Catarina Campos

Antes do mais, recomenda-se a leitura deste meu post, para se perceber o que é o défice.

Depois faz-se aqui um disclaimer, que esta é, como sempre, a minha opinião absolutamente pessoal.


Segue o OE num parágrafo e o resto em mais uns quantos.


o OE (Orçamento de Estado) é exactamente a mesma coisa que todas as minhas caras leitoras, no seu papel de donas-de-casa, fazem todos os meses, com a diferença que o Estado é a Casa delas e portanto fazem o OC. De resto é igual: entra dinheiro de várias fontes - receita - e sai para vários lados - despesa. Receita, no OC é salário+/ou outras fontes de rendimento, no OE é impostos + NADA; despesa no OC é pagar contas e no OE é pagar contas. Qualquer dona-de-casa eficiente faria uma melhor figura a gerir este país que este conjunto de nabos, mas isso já são considerações de ordem subjectiva, que vou tentar conter, mas ainda farei mais uma: sabem as caras leitoras quando se vêem a braços com aquelas situações em que ainda falta pagar a conta da água e da mercearia e aparece o parceiro com quem se divide receitas e despesas, todo contente com um saco de dvd's, livros para acrescentar à pilha e mais umas quantas merdas de bricolage, decoração e animação automóvel? Trocado em OE's, esses saquinhos de bens não essenciais, são submarinos e TGV's: brinquedos de gajos. Lá está. QED e siga para o FMI.


Escusado será alongar-me na parte em que se indica que

- o OE proposto é uma merda

- Os gajos não se entendem

- Misturar política com economia só dá porcaria

que isso toda a gente já sabe.

 


Vamos lá então para o mito FMI.


Só vamos saber se o OE é aprovado daqui a uns dias. Entretanto toda a gente (incluindo os portugueses) já percebeu que isto não está grande espingarda e digamos que a confiança, quer interna, quer externa, está pelas ruas da amargura, sendo que está última é inversamente proporcional ao estado da dívida pública. Uma desce, a outra sobe: se parece que não conseguimos pagar a conta, os juros sobem, porque o risco aumenta, obviamente. As caras leitoras emprestariam o melhor par de sapatos a uma amiga que o devolveria em estado impecável e a amiga oferecia uns chocolates como agradecimento, mas se soubermos que a amiga dá cabo deles, se calhar dizemos-lhe, olha filha empresto-tos mas empresta-me aí esse casaquinho entretanto, que se os sapatos vierem todos lixados, vês o casaco por este canudo - esta é a posição dos investidores estrangeiros, a dívida externa é exactamente a mesma coisa: se a malta não paga, pois obviamente que dá em troca o casaco. Neste momento estamos na fase de até já dar as cuecas, ou inclusive baixá-las. Financeiramente falando, claro.


Face a isto temos três hipóteses: ou há OE ou não há. A terceira (que é separadas das duas primeiras, porque havendo ou não havendo OE aprovado, a verdade é que o FMI  vai começar a falar mais em português e eu não acredito em coincidências e sim em circunstâncias e planeamento) é o tal do FMI que está para os portugueses como a Nossa Senhora de Fátima. Entra por aí fora a pedido e preces, faz uns milagres e isto fica tudo lindo. Era bom, mas não é nada assim, minhas amigas.


Primeiro, um país que não consegue ter um OE aprovado, é uma vergonha. Todos sabemos, mas isso tem um preço. Ok, pois o brio deste país não vale porra nenhuma, adiante, esqueçam, somos incompetentes e atestamos com um chumbo no OE que de qualquer forma é uma merda. Venha o FMI, vamos supor.


O FMI chega e endireita? Diz-se em jeito de mesa de café, que venha, endireita este descalabro todo de uma vez, já que ninguém consegue. Eu também, confesso, tenho esse meu lado de pastorinho à beira da oliveira. Mas agora, mais que nunca, temos que pensar friamente. O FMI chega, analisa e corta. Sim, a dívida externa baixa. Sim, endireita qualquer coisa. E sim, corta a direito. Corta a direito, perceberam? Não há mais conversa, discussões sobre o preço da margarina ou sobre gente a comer de caixotes do lixo. Corta mesmo onde for preciso. E depois, dá o dinheiro a quem? Ah a quem governa. Pois é. Naquela, corta-se aqui e tomem lá mais, agora ganhem juízo. Alguém acha que isto resulta?! Eu tenho algumas dúvidas. Tenho sempre dúvidas quando é preciso tratar os países como crianças mimadas que partem os brinquedos e pedem outros, porque não tenho a certeza que cresçam se lhes derem um raspanete e brinquedos novos. Queria muito - de mãos postas - que o FMI resolvesse todos os nossos problemas. Mas infelizmente, parece-me que também não é por aí.


Soluções fáceis? Não há. Há e vai haver um país pobre a levar cada vez mais pancada até mudar de hábitos. Até nos convencermos todos - todos - que assim não vamos lá. Até nos convencermos que temos que fazer mais, muito mais, gastar menos, muito menos, a troco de ainda menos. E essa porra custa. A única razão que me leva a isso, que me motiva é só uma: é o MEU país. É o país dos nossos filhos. Ainda é, pelo menos. É um bocado de brio e teimosia e ainda acreditar que há gente decente.


E este post virou lamechas e irracional, portanto fica já por aqui com uma nota final para reflexão: não há milagres grátis.

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