Reality check - o país Freeze
Onde se fala de palavras acabadas em "ões", escutas, primos do karaté, Crespos fofinhos, águas com gás, comboios a andar na bisga e blogues muito chatos. E onde ainda se afirma, nas palavras imortais de Ivone Silva e Camilo de Oliveira, que "este país está um colosso, está tudo grosso, está tudo grosso".
Vamos por partes.
Não estou nem aí para esta polémica toda. Confesso a minha incapacidade para compreender as ramificações, implicações e outras palavras caras acabadas em "ões" que esta embrulhada encerra.
Sei quem é o tal de Sócas - é o primeiro-ministro - e pouco mais.
Granadeiros, administradores, sucateiros, primos do karaté, mocitos a brincar aos gestores, escutas, empresas de nome estrangeiro de pessoas com dois "éles" no apelido, offshores, censuras daqui e dali, planos para controlar não sei o quê, nada disso me diz alguma coisa.
Também sei quem é aquele senhor que aparece na televisão, o Crespo, e acho-o fofinho. Conheço a outra senhora da boca grande porque... pronto. Tem uma boca grande e diz aquilo do "boa noite, sou a não sei quantas e vou dar porrada em todos".
Sei que, no meio disto tudo, o único plano conhecido para os próximos anos é construir um aeroporto em nenhures, fazer um comboio para andar na bisga e construir auto-estradas para que a elite possa chegar mais rapidamente às suas dachas na província.
E sei mais uma coisa. Enquanto esta malta se entretém na brincadeira, a reinar aos partidos, aos administradores e aos jornalistas, o pais que é suposto governarem, gerirem e desenvolver, está na mesma.
É como no anúncio da Freeze: Ai e tal estou tão mal disposto, vou tomar um Freeze PS com gás. Oh, tou na mesma! Ah vou experimentar um PSD. Oh, tou na mesma! Então e se misturar os dois? Oh, tou na mesma! And so on...
A verdadinha, oh meus amigos, é que esta gente está tão preocupada com o país como um bombista suicída com a conta do telefone no fim do mês.
O grupo inclui os milhentos blogues chatérrimos onde se confrontam alguns dos maiores egos do hemisfério sul, acusando-se diariamente de serem "xixi-cocó", "feios" e outros insultos que a decência me impede de reproduzir (aliás, sinto-me enrubescer só de pensar nisso).
Costumo dizer que Portugal, ao contrário do que gostamos de pensar, não é assim tão diferente do resto do mundo civilizado (uma lista que não inclui o Afeganistão, a Somália e a Suíça). Em toda a parte os políticos são tipos cheios de truques que colocam o partido à frente de tudo, em todo o lado existem políticos incompetentes e corruptos. Em toda a parte o Estado é imperfeito e as corporações são tão gananciosas e maléficas quanto um Darth Vader com TPM.
O nosso problema é apenas a escala da coisa. É que nos outros lados eles são isso tudo, mas um bocadinho menos. E esse bocadinho menos é o que permite que o país funcione.
Portanto, jovens Jedis, para melhorar Portugal, não é preciso outro Salazar (que se tivesse sido um bocadinho mais esperto, tipo o Franco, tinha deixado entrar alguns liberais para o governo no início dos gloriosos sixties), não é preciso entregar isto aos espanhóis (que são os tipos mais parecidos connosco em todo o mundo, com a única diferença que acabam as frases em "coño" ou "joder"). Tampouco é preciso arrasar a terra com bombas atómicas ou limpar isto com uma revolução bolivariana (Desculpa ó Chico, mas isso cá não resulta).
Só é preciso que:
a) Gamem um pouquinho menos.
b) Entre os vossos boys and girls nomeiem um ou dois tipos competentes, daqueles para trabalhar mesmo, paguem-lhes muito bem e apoiem-nos. Não se esqueçam, são eles que vão levar esta porra para a frente e permitir-vos ficar no poder mais um mandato ou isso.
c) De vez em quando, deixem que um de entre vós vá dentro. O povo sente-se melhor e podem sempre prometer-lhe que ao sair lhe dão um iate e uma casita nas Bermudas.
d) Controlem a imprensa, mas um bocadinho menos e de forma menos desajeitada. E pensem assim: de qualquer forma ninguém lê jornais e a malta que vê televisão só quer é novelas e séries parvas com vampiros.
e) Sejam um poucochinho mais sofisticados. Às vezes parecem garotos e a malta começa a reparar. Lá fora também. E isso é chato.
f) Permitam, de vez em quando para não habituar mal, que algumas pessoas do povo possam subir na vida. Fica bem e tira aquela imagem de que isto é só para alguns. Nos Estados Unidos os gajos são bons nisso.
g) Melhorem a educação só um bocadicho. A sério, se for só um bocadinho, não faz mal. Ficamos mais bem classificados nos rankings internacionais e isso dá credibilidade do país, algo que, a longo prazo, pode ser bom para vocês.
h) Para a malta dos blogues políticos: Tentem não se zangar dia sim, dia não e fazer um ar muito ofendido como se a vossa irmã tivesse sido violada pelos mouros. Não digam nada a ninguém, mas há pessoal que começa a rir-se nas vossas costas.
Na realidade, basta isto para melhorar o país. Simples não é?